Percebi
no almoço de hoje, quando minha tia começou a discorrer sobre a situação atual,
que vivemos uma crise ética, atrelada à crise político-econômica: "Porque
eu acho que a televisão não deveria... Porque eu acho que... Porque eu acho...
Eu acho...".
“Eu
acho” – é uma crise de ética, há éticas, isto é, modos-de-vida, formas-de-viver
imbricando-se, enfrentando-se, em conflito, concorrendo pela hegemonia, pelo
espaço dominante, pelo acordo tácito que guia o cotidiano, que (co)ordena a vida
da mais vulgar à mais elevada – e aqui cabe um parêntese das esferas altíssimas
de poder e dinheiro, as quais se evadem de qualquer moral por uma ética fluida:
de um lado líderes do povo, do outro corruptos e corruptores. E aqui se pode
ler a essas éticas em disputa como a
pilhagem em busca da hegemonia, a corrida pelo topo – para usar termos de uns
pensadores muito bons, é a crise das
ideologias.
Há
um quê de primitivismo, mas um primitivismo anacrônico, não pejorativo, algo
que tem seu valor, ainda que não em polos urbanos, todavia ainda não houve contato
suficiente para que o espírito da urbe absorvesse essas índoles adversas a si. Os
valores de hipercompetitividade, de individualismo pleno, de defesa agressiva
do que é seu, são valores primevos. Eles remetem à escassez de recursos: é
você, seu tacape (seu revólver), seu clã (sua família e amigos próximos) e fora
da sua caverna (sua quebrada), todos querem ou sua caça e coleta (seu emprego)
ou suas coisas (bens e posses), e esses outros
estão dispostos a matar por isso – então se torna uma corrida onde você tem de
matar ou se aliar aos mais fortes para garantir sua parte.
Entre
a favela e a caverna não há muita diferença... Paras esferas mais altas percebo
uma sensação desesperada, uma desilusão em curso, algo como uma angústia
ansiosa, acelerada, quase eufórica, praticamente burocrática: “não há como alimentar
todos com salmão e caviar, fazer isso custará o meu salmão e caviar”.
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