5. É difícil definir o inquietante (das Umheimlich) em termos metapsicológicos. Infinitamente mais fácil é esta (e qualquer outra) empreitada (explicativa) em termos particulares (em verdade particularistas). É sempre fácil partir de si e permanecer nessa esfera, não sair de si, remeter e retornar a si (linguagem egocêntrica de Piaget?). Outra facilidade é pensar em universais: são infinitamente abstratos, portanto não servem para nada, mais ficcionais que a própria ficção (como entendida pelo vulgo). A gigantesca – maior que o próprio infinito do universal e mais detalhada que o infinitesimal do particular – imagem situada no meio é o que interessa. Mas o que é esse meio? Que imagem é essa? É aquele conjunto exorbitante de coisas interessantíssimas chamadas por Marcel Mauss de cultura. É (em alguma medida e somente em alguma medida) o que os (melhores) marxistas chamaram totalidade. É o Grand Verre de Duchamp, a imagem dialética de Benjamin, a modernidade de Baudelaire.
6. Fragmento de diálogo: "Sempre supus que beijar de olhos abertos era um mau-caráter. Sinal de ausência da entrega exigida pelo verbo." E outro trecho: "caminhar na praia é genial."
7. Vinculaço (vínculo + laço: double bind). É imemorial tudo aquilo que é abrangente e antigo o suficiente para ser arcaico e mítico, isto é, originário e verdadeiro. É preciso dialogizar a imagem e imaginar a linguagem. Dizer o indizível e imaginar o inimaginável. Tato e toque são limites fronteiriços dum mesmo ato ou gesto, como se queira chamar. A maior parte dos autoproclamados marxistas são estúpidos em suas segregações (porque em verdade é só isso que fazem): dialética é parte da metafísica (sim, não é seu wet dream da tal "totalidade", seja lá que porcaria é isso). Só compreendeu deveras a aufhebung hegeliana, ou seja, toda sua dialética (nada tem a ver com a "síntese" fichteana), quem compreendeu a imagem dialética benjaminiana. Estes meus tênis têm muito cimento das mesmas calçadas.
8. Hoje, um romance qualquer lida com um fragmento de tempo, uma fração de instante, aquilo que cabe numa ampulheta, numa fotografia, num vine, num vídeo qualquer, numa selfie, numa memória a ser arquivada, portanto, num arquivo, numa extensão (esse termo é sintomático da nossa condição de ciborgues). E algumas pessoas – sem saber, a partir disso – tratam outras como se ninguém mudasse, como se o tempo inexistisse ou não agisse (sobre a redução da importância do tempo e a sobrevalorização do espaço [superficializado, pura superfície]: cf. a produção recente de journals de arquitetura com excelentes reflexões). As narrativas antigas giravam ao redor da transformação, da mudança, da variação, do diferimento produzido no e pelo tempo sobre um herói, um personagem, um conjunto de valores que se enraizava em alguém, ou que tomava corpo e se construía, e tudo isso fazia sentido afinal, todo mundo crescia, envelhecia (vide o bildungsroman dos alemães, o "romance de formação"). É por isso que os romances hoje são tão breves em termos de temporalidade cronológica ou absoluta, toda uma vida deve caber num acidente de carro, numa noitada (que expressão medonha!), o "amor da (minha) vida" deve durar até a próxima festa open bar. Exatamente porque a tendência a mudar se perdeu, porque as pessoas pouco ou nada mudam, é que tratam umas às outras como essências eternas imutáveis, invariáveis, e elas mesmas, que reclamam da invariabilidade dos outros, também se recusam a mudar. Por isso é sintomática a proliferação dum discurso como "me aceite como eu sou ou vá embora", porque você pode mudar e eu também, todos podemos, então isso aí é coisa de encostado, de preguiçoso, de quem vive numa hipocrisia de querer um mundo melhor, mas não querer tornar-se melhor para o mundo, ou seja, de quem não quer realmente um mundo melhor, só quer no discurso, da boca pra fora, só quer pra ser aceito, pra fazer imagem, pra ser bem visto (e a visão, essa visão pobre, parca, sem profundidade e sem tato, absolutamente nada dialética, está muito em voga, está disseminada, proliferada como uma doença). Daí o mundo parece estar eternizado num "fim da história", num "já-sentido", etc. e tal, porque as próprias pessoas, que fazem a história todos os dias em suas vidas, como as células todas juntas com alguma coordenação e algum caos fazem a vida (e a história, mesma coisa,) do corpo, não fazem nada diferente, não mudam. É óbvio que o mundo não mudará se ninguém mudar.
6. Fragmento de diálogo: "Sempre supus que beijar de olhos abertos era um mau-caráter. Sinal de ausência da entrega exigida pelo verbo." E outro trecho: "caminhar na praia é genial."
7. Vinculaço (vínculo + laço: double bind). É imemorial tudo aquilo que é abrangente e antigo o suficiente para ser arcaico e mítico, isto é, originário e verdadeiro. É preciso dialogizar a imagem e imaginar a linguagem. Dizer o indizível e imaginar o inimaginável. Tato e toque são limites fronteiriços dum mesmo ato ou gesto, como se queira chamar. A maior parte dos autoproclamados marxistas são estúpidos em suas segregações (porque em verdade é só isso que fazem): dialética é parte da metafísica (sim, não é seu wet dream da tal "totalidade", seja lá que porcaria é isso). Só compreendeu deveras a aufhebung hegeliana, ou seja, toda sua dialética (nada tem a ver com a "síntese" fichteana), quem compreendeu a imagem dialética benjaminiana. Estes meus tênis têm muito cimento das mesmas calçadas.
8. Hoje, um romance qualquer lida com um fragmento de tempo, uma fração de instante, aquilo que cabe numa ampulheta, numa fotografia, num vine, num vídeo qualquer, numa selfie, numa memória a ser arquivada, portanto, num arquivo, numa extensão (esse termo é sintomático da nossa condição de ciborgues). E algumas pessoas – sem saber, a partir disso – tratam outras como se ninguém mudasse, como se o tempo inexistisse ou não agisse (sobre a redução da importância do tempo e a sobrevalorização do espaço [superficializado, pura superfície]: cf. a produção recente de journals de arquitetura com excelentes reflexões). As narrativas antigas giravam ao redor da transformação, da mudança, da variação, do diferimento produzido no e pelo tempo sobre um herói, um personagem, um conjunto de valores que se enraizava em alguém, ou que tomava corpo e se construía, e tudo isso fazia sentido afinal, todo mundo crescia, envelhecia (vide o bildungsroman dos alemães, o "romance de formação"). É por isso que os romances hoje são tão breves em termos de temporalidade cronológica ou absoluta, toda uma vida deve caber num acidente de carro, numa noitada (que expressão medonha!), o "amor da (minha) vida" deve durar até a próxima festa open bar. Exatamente porque a tendência a mudar se perdeu, porque as pessoas pouco ou nada mudam, é que tratam umas às outras como essências eternas imutáveis, invariáveis, e elas mesmas, que reclamam da invariabilidade dos outros, também se recusam a mudar. Por isso é sintomática a proliferação dum discurso como "me aceite como eu sou ou vá embora", porque você pode mudar e eu também, todos podemos, então isso aí é coisa de encostado, de preguiçoso, de quem vive numa hipocrisia de querer um mundo melhor, mas não querer tornar-se melhor para o mundo, ou seja, de quem não quer realmente um mundo melhor, só quer no discurso, da boca pra fora, só quer pra ser aceito, pra fazer imagem, pra ser bem visto (e a visão, essa visão pobre, parca, sem profundidade e sem tato, absolutamente nada dialética, está muito em voga, está disseminada, proliferada como uma doença). Daí o mundo parece estar eternizado num "fim da história", num "já-sentido", etc. e tal, porque as próprias pessoas, que fazem a história todos os dias em suas vidas, como as células todas juntas com alguma coordenação e algum caos fazem a vida (e a história, mesma coisa,) do corpo, não fazem nada diferente, não mudam. É óbvio que o mundo não mudará se ninguém mudar.
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