terça-feira, 3 de abril de 2018

Diário - 2018/02/23

197. Por muito tempo concordei com César Aira intuitivamente: não há literatura "abstrata" (no sentido que se usa para as artes visuais não-figurativas), porque a semântica é, em grande parte, referencial e não há modo simples de se desligar essa máquina. Creio, contudo, as Musas inquietantes alcançam o objetivo, satisfatoriamente ou não, não importa, por um excesso de referência, tecnicalidade extrema e "objetividade/neutralidade". (isso não quer dizer que só haja literatura realista, isso seria a morte da literatura e o fim do pensamento, ou vice-versa, quer dizer ainda outra coisa) 

198. O erro dos chamados pós-modernos foi crer que a máquina referencial (para não dizer máquina semântica) era um problema. Não é. Muito bem nos ensina Sellars, não há pré-conceito, só conceito-pré, quer dizer, não existe dimensão a-conceitual do pensamento, "puro dado" ou "puro fato" são em si mesmos abstrações, seriam inacessíveis mesmo. Não só já são interpretados pelo sistema senciente/sensível ao traduzir para internalizar/vivenciar/adicionar o matiz afetivo, como também nossa relação com esse sistema já é ela mesma conceitual e abstrata. Daí uma das utilidades da existência dessas máquinas, como a semântica, ou a referencial.

199. Ao linguajar, i.e., usar linguagem, o sujeito não transmite ideias, tampouco passa significados de lá para cá e de volta para lá, ao contrário, sentidos (tres)passam(-no) e é isso que nos ensina a semântica.

Diário - 2018/03/17

196. Quero discutir a "virada mística" de um amigo. Poderia dizer "virada espiritual". Tanto faz, até "religiosa", se quiser. O problema é que ele acha que descobriu a roda ou a pólvora, mas só chegou na base de qualquer espiritualidade. As vezes nem na base, só em concepções muito bizarras, muito erradas. Conhecer religiões tradicionais, antigas, dá muita luz nessas horas: você não pensa nem fala idiotices. Basicamente virou "espiritualidade Deepak Chopra", "new age", neomisticismo, numa palavra: burrice. As vezes eu acho que é falta de estudo, falta de leitura e foco, deficiência de vitamina P(ensamento). "Ah, porque eu tive uma experiência..!", eu tive várias e não fico propagando besteira por aí. Também há conhecimento, aprendizado e sabedoria na mística, na espiritualidade. Sujeito chegou agora na brincadeira e acha que sabe! Só pra rir, mesmo. Esse é um dos momentos onde tradição faz falta.

Diário - 2018/03/08

194. No canto da visão estava um homem sentado, curvado, cabeça quase nos joelhos. Virei-me e vi cadeiras empilhadas.

195. Disseram numa banca de mestrado que buscar fama/reconhecimento é ser o mais tradicional possível (conservador no sentido dos esquerdistas?). Mas será isso mesmo? A fama é um fenômeno contemporâneo, como pensar essa vinculação bizarra?

Diário - 2018/03/07

191. Ainda não se tem muita clareza, mas é preciso separar o dogma do axioma, pois não são sequer parecidos. Algo que vira e mexe emerge no pensamento contemporâneo é levar em conta as consequências como porção definidora junto dos outros fatores, das outras porções. Talvez por axiomas gerarem ciência e dogmas gerarem falência haja uma separação, ou pelo menos seu embrião.

192. Falta-nos, enquanto instituição, rigor alemão. Não é para eliminar o pensamento molenga dos franceses, muito útil, eu adoro, mas é para nos protegermos, nos blindarmos de acusações contemporâneas.

193. Durante a aula, convidados a falarmos de nós mesmos, de alguma peculiaridade nossa, a primeira garota a abrir a boca só emitiu pontos externos, de validação social: "ai, sei lá, eu sou esquerdista, feminista, sei lá". O que houve para a extinção da experiência interior? Talvez daí, em parte, a famosa profetização da decadência e fim da literatura. Pois há o fim da vida íntima. Empty shells. São carcaças vazias para essas bandeiras.

Diário - 2018/03/06

186. O livre-arbítrio causa muita dor de cabeça. Há quem diga que não existe. Tudo bem, pode não existir. Mas aí restam duas questões: a) por que se faz/tem experiência dele? b) qual pergunta colocar no lugar de "o que fazer?"?

187. A estrutura da teodiceia, o famoso "porque Deus quis", se repete em diversos níveis no pensamento pós-moderno. Talvez porque o pós-moderno repita a estrutura geopolítica do império bizantino, por exemplo, onde e quando ocorria o abandono da teologia e a fundação da teodiceia, quer dizer, o abandono de uma reflexão (e) de (uma) sabedoria (de viver) traduzida em atitude e a fundação de uma narrativa jurídico-política totalizante justificando o império, as hierarquias, e o estado atual de coisas. Veja-se bem: a experiência mística (sabedoria reflexiva tornada atitude) proposta, por exemplo, por Cristo, desestruturava as hierarquias romanas e judaicas, tomando a proposição da igualdade radical. Sucede-se uma mistagogia, um esforço de sistematizar essa revolução do viver para torná-la experiência de todos, assim o iniciado faz parte e o não-iniciado não faz parte da religião, ou seja, da experiência mística, porque vivem de modos diferentes. Com a oficialização da religião, surge uma quebra: quem nasceu no território é daquela religião, portanto dispensa-se a experiência mística, anteriormente definidora da identidade e do pertencimento religiosos. Então as práticas linguísticas sob o nome 'teologia' abandonam a reflexão crítica e vão apenas tentar justificar aquela religião como correta, enquanto também tentam dogmatizá-la, i.e., produzir axiomas jurídico-políticos para reger moralmente a vida naquele ambiente geopolítico. Por isso a religião (oficial) é dogmática e o dogma é individual: é a polícia da vida. Já não é mais a experiência mística – abertura para outra forma de vida através da revelação –, mas apenas jurisdição e moralismo, imperialismo sobre a vida. O que se deve recuperar, portanto, é a mistagogia, a sabedoria de viver iniciada pelo místico fundante e sistematizada por seus discípulos também sábios (não obrigatoriamente os mais próximos no espaço-tempo, senão aqueles mais próximos na sabedoria, na experiência mística mesmo, fato muito turvado por narrativas oficializantes, daí um dos problemas da canonicidade). Resta notar a importância do artista nessa questão toda. O artista revela(-se) o mundo. Quer dizer, tem uma percepção do mundo revelada a si, produzindo percepções reveladoras do mundo. Aqui o vínculo entre mistério e místico deve estar óbvio. Por essa e outras questões, o artista explicitamente engajado em temáticas políticas dificilmente dirá algo revelador, exatamente porque está preso ao já-exposto, só pode reafirmar o óbvio, o que já se sabe, só pode "tomar posição", mas não consegue instaurar uma posição através da produção duma sensibilidade ou outro processo qualquer.

188. Creio ter desejado experimentar quando criei S&D. Eu estava testando uma tentativa nova, parece-me hoje (dez anos depois). Algo angustiante sem cair no absurdo, aterrador sem falir em terror. Algo único.

189. Vivemos uma era sensível, estética (se o termo não for idiotamente tomado como caliologia, mas como estésica) mesmo: o que importa é sentir e fazer sentir, comoção. A moção propriamente dita, o movimento, desapareceram, em nome da "sensibilização", termo tão em voga na minha formação escolar primária. Não, não essa sensibilização, essa é desnecessária. Só há duas saídas (sim, uma disjuntiva terrível, necessária igualmente): o pé no chão estóico reavivado; a loucura do furor heroico, sua imersão inevitável, inelutável, até à extinção (de si).

190.  Por que as pessoas querem ser bonitas? Por que batem fotos com ângulos assim, olhares assados, sem bocas, narizes distorcidos? Minha sensibilidade é profundamente cagada, toda errada, mas eu só conheci duas belezas até hoje: músicas, só algumas; atos de sacrifício de si pelo bem alheio. Somente. Não vejo beleza em romances. Nem em pinturas ou desenhos. Nem em esculturas. Nem em superfícies que toquei. Nunca cheirei odores belos ou bonitos.

Diário - 2018/03/05

183. Ainda lembro quando vi o padre chorando. Dirigiu a divina liturgia muito rapidamente. Chorou ao final. Não se pronunciou. Nossa amiga notou e eu fui verificar, mesmo sendo recém-chegado, era o mais íntimo. Rituais, rituais, enfim conversamos. Sentia-se sozinho, saudades de casa, poucos amigos. Sempre achei que os padres tinham a Deus. Não poderiam sentir solidão. Ledo engano. Somos todos os mesmos. (Ele está muito alto)

184. Uma teoria da leitura, da literatura, envolve inevitavelmente uma teoria do autor, do leitor, da compreensão, da subjetividade, do significado, em suma, é impossível passar pela linguagem. Tudo isso quer dizer que há muito mais onde se pensa que não há quase nada.

185. É preciso fazer (novas, isso pode significar as mesmas) grandes irregularidades linguísticas.

Diário - 2018/03/04

180. Durante anos pensei que a música não fosse uma linguagem universal, tomava então as diferenças entre os gêneros, as tradições, as afinações/temperamentos, os estilos dos artistas e, na origem disso tudo, os gostos e preferências dos ouvintes. Tolice minha! A igualdade (universalidade) está em que todos têm preferências, todos podem se emocionar com tal ou qual composição. E é uma igualdade nuançada, um universal particular, um singular plural. É uma sagacidade, uma perspicácia, talvez até uma audácia. Uma igualdade mínima, alguém dirá, sem dúvida, concordarei, mas ninguém disse que se deveria começar ou encontrar igualdades extremas ou máximas. Talvez possamos chegar nelas.

181. As postulações crísticas afirmativas (suplantando a negatividade dos mandamentos precedentes) demonstra como a separação bem x mal já configura o fracasso da (verdadeira) bondade: se há "nós versus eles", acabou a humildade, o perdão, a benignidade, etc., todas as virtudes. Inexiste caridade com inimizade ("perdoa teu irmão antes de prestar tua oferta ao Pai" e tudo o mais). Cristo vem relegar toda "história de heróis" – assim denominemos o vício nas divisões (falsamente bem delimitadas) "bem versus mal" – ao passado arcaico e suprimido, realmente superado, estabelecendo o reino vindouro, o "reino doutro mundo", reino dos iguais.

182. A postulação de Leopardi nas páginas quatro mil cento e qualquer coisa do Zibaldone sobre o Mal me remete à pergunta do "por que há algo (vida, mundo, língua) em vez de nada?" como aplicada exatamente ao terceiro termo dos parêntesis dada a conjuntura atual: por que ainda há poesia em vez de silêncio?

Diário - 2018/03/03

179. Escreve-se no início do texto de hoje da Fausto mag: "Em 2018, comemoramos 190 anos do nascimento de Liev Tolstói.

Os grandes romances que escreveu – Guerra e Paz, Anna Kariênina e Ressurreição – não figuram entre as obras-primas da Literatura Universal apenas porque são histórias interessantíssimas, mas, principalmente, porque dizem sobre a natureza humana. Não a natureza do outro – ainda que possa vir a ser a natureza do outro –, mas a nossa.

Obras-primas da Literatura são então como espelhos. Ou melhor! Obras-primas da Literatura formam parte de nossa consciência."

Logo se vê que é uma escrita bem bosta, bem medíocre. Já começa numa confusão com hipocrisias como "natureza humana" (nossa? do outro!? delirantes!) e segue piorando pela incapacidade de ver a repetição feita em "espelho" e "consciência" – dá na mesma! O homo sapiens é tão mídia quanto qualquer outro vivente. É mesmo um dos maiores responsáveis pela proliferação das imagens! Quanta bobagem só para defender e congratular um morto. De outras terras!

P.S. eu poderia, talvez devesse mesmo, analisar o resto do texto, mas é intragável. Insuportável. Sem exagero. Não consegui ler até o fim. É horrendo, para dizer o mínimo. Abunda lugares-comuns. And it lacks brains.

Diário - 2018/03/02

171. Em tom de César Aira: Quem escreve tem uma sensibilidade mais filosófica, mais racional, mais consciente (digo assim por falta de termos melhores nesta manhã) comparado a quem desenha, por exemplo. Não digo consciente da ou na pieguice esquerdista, senão simplesmente esse pensamento capaz de se pensar. A imaginação visual pode ser abstrata ("não-figurativa", dizem os especialistas), a linguística jamais. Isso não é defeito ou motivo de choro, é só como as coisas são. Como as coisas se dão. A escrita moderna – chama(va)m escritura, poesia – tem disso de (se [meter a]) pensar. Oponhamos, pois oposições são muito modernas, a escrita a o escrito. É uma ideia interessante, só para evitarmos os termos de sempre – renovar as palavras é impedir à força a necrose (impedir a necrose à força?). A escrita é maleável, já apareceu em verso e prosa.
P.S. não é a alusão, nem a referência, tampouco a dificuldade, nem mesmo a forma(ta)ção, também não a invenção, ou a falta de sentido (ou seu excesso). É ainda outra coisa e claramente não a sei delinear, menos ainda definir.
P.P.S. talvez seja "encontrar uma língua"; mesmo isso parece insatisfatório, mas é preciso começar de algum lugar.
P.P.P.S. tem mais a ver com alquimia e ocultismo, hermetismo e esoterismo. Não é magia, estejamos atentos.

172. Odeio burocracia. Sinto-me nu (à força).

173. Um amigo começou a se perder como eu para os encantos da filosofia, está deixando sua poesia de lado (ele não era muito da prosa). Tenho medo disso. Quero dizer, parece-me um problema sério, um espírito do tempo, uma moda de época: "filosofia é legal porque o trabalho da ficção surge na criação de conceitos", tudo bem, mas ninguém está tão livre quanto estava na ficção, estão (estamos?) todos preocupados com (um)a realidade, com (um)a sociedade, etc., esse tipo de baboseira. Perdemos a última liberdade. Estamos nos alienando de nós mesmos. O que restará?

174. "À força" apareceu duas vezes, nas duas primeiras entradas de hoje, e agora é só oito da manhã. Não sei o que nos permeia, mas é aterrador.

175. Escreve-se por amor à literatura. Nada mais (nem menos).

176. Se é preciso come to terms com a mímese, façamos esse terrível trabalho: a arte não representa belamente, não deve criar imagens belas. (Quase) Ao contrário, deve imaginar justamente.

177. Literatura é devoção (total) à língua. "Qual língua?", perguntará o incrédulo. Não sabemos (ainda).

178. "Perto é outra coisa. Tuas fotos não te desenham nem um pouco.", disseram a ela.

Diário - 2018/03/01

164. Essa retomada do corpo, da performance, e afins, não passa de uma conjunção do desejo de um futuro que nos foi roubado pelo kapital e da saudade da presença, do evento, messianicamente definido e estimulado. Por um lado é falso, porque não teremos salvação se não a fizermos nós mesmos, não há "outro", magicamente diferente até os ossos, capaz de nos tirar da infinita devoração de Qi/Chi/Ki; por outro lado, é também falso, porque o projeto messiânico é o projeto de nossa devoração de Qi/Chi/Ki, de nossa subjugação e destruição, e isso é igual a humanismo, é igual a antropocentrismo, é igual a pós- e trans-humanismo.

165. Há coisas que sempre serão iguais. Simplesmente são assim, não mudar é sua mudança. Recusar-se. A terra, por exemplo. Outro exemplo? A poesia, essa sempre permanecerá a indefinição de si mesma. Verdadeiro não.

166. Como não existe "Eu absoluto", não existe "não-eu".

167. Outro mundo é sempre este mundo. Só muda como vivemos.

168. É preciso cortar. Não sei bem o que, mas é. Uma urgência de corte demanda um corte de urgência.

169. Encarei a tela branca desta entrada por quase dez minutos. Não sei o que escrever. Por que a escrita se nos esvai? O que há quando a musa se ausenta?

170. ∅

Diário - 2018/02/24

160. Talvez haja algo de inimitável entre uma arte e outra, duma para as outras. Classificatórias baseadas no espaço-tempo ou nos cinco sentidos são inúteis porque todas as artes entrarão nalgum momento, com suas respectivas potências em cada aspecto. Há aproximações e distâncias e é tudo uma questão de defesa, ou seja, não há verdade, é só retórica. Quem sabe a verdade seja retórica? "Ou a retórica seja verdade?", falso, porque a mentira é possível. Inverter a fórmula da verdade pela da mentira apenas porque esta última tem mais ocorrências e instâncias parece interessante, mas permanece insuficiente, especialmente quando se leva em conta a ética, coisa que muita gente já deixou de fazer faz tempo, daí o estado atual de coisas. Por quanto se queira, é impossível se livrar da verdade em última instância. O que é possível é refinar seu pensamento (sim, a ambiguidade do pronome é proposital e necessária) – eis a ficção, forma menos rude, menos rudimentar de conceber a verdade.

161. Entro no segundo ônibus, perdi o primeiro. Em ambos não há elevador. Uma garota sobre cadeira de rodas aguarda, visivelmente impaciente. Não me desperta compaixão, ou sofrimento, nada. É um vácuo. Não a vejo, não a ouço, não a toco, não a cheiro, não a saboreio, não a sinto, não a penso. Definitivamente não estou anestesiado, é ainda outra coisa, outro lugar, outro pensar, talvez algo impensado.

162. Pensar e pesar soam parecidos. Há algo aí.

163. Sensível é aquilo que está pensado já fora dos objetos e ainda não dentro dos sujeitos (não necessariamente humanos, sempre vale lembrar, um espelho, por exemplo, é o sujeito por excelência, arquetípico, do sensível visual). O tal "espírito objetivo" hegeliano não passa disso, duma recepção praticamente passiva dos sensíveis por parte do "espírito (do sujeito)".

Diário - 2018/02/24

156. Talvez haja algo de inimitável entre uma arte e outra, duma para as outras. Classificatórias baseadas no espaço-tempo ou nos cinco sentidos são inúteis porque todas as artes entrarão nalgum momento, com suas respectivas potências em cada aspecto. Há aproximações e distâncias e é tudo uma questão de defesa, ou seja, não há verdade, é só retórica. Quem sabe a verdade seja retórica? "Ou a retórica seja verdade?", falso, porque a mentira é possível. Inverter a fórmula da verdade pela da mentira apenas porque esta última tem mais ocorrências e instâncias parece interessante, mas permanece insuficiente, especialmente quando se leva em conta a ética, coisa que muita gente já deixou de fazer faz tempo, daí o estado atual de coisas. Por quanto se queira, é impossível se livrar da verdade em última instância. O que é possível é refinar seu pensamento (sim, a ambiguidade do pronome é proposital e necessária) – eis a ficção, forma menos rude, menos rudimentar de conceber a verdade.

157. Entro no segundo ônibus, perdi o primeiro. Em ambos não há elevador. Uma garota sobre cadeira de rodas aguarda, visivelmente impaciente. Não me desperta compaixão, ou sofrimento, nada. É um vácuo. Não a vejo, não a ouço, não a toco, não a cheiro, não a saboreio, não a sinto, não a penso. Definitivamente não estou anestesiado, é ainda outra coisa, outro lugar, outro pensar, talvez algo impensado.

158. Pensar e pesar soam parecidos. Há algo aí.

159. Sensível é aquilo que está pensado já fora dos objetos e ainda não dentro dos sujeitos (não necessariamente humanos, sempre vale lembrar, um espelho, por exemplo, é o sujeito por excelência, arquetípico, do sensível visual). O tal "espírito objetivo" hegeliano não passa disso, duma recepção praticamente passiva dos sensíveis por parte do "espírito (do sujeito)".