terça-feira, 3 de abril de 2018

Diário - 2018/03/02

171. Em tom de César Aira: Quem escreve tem uma sensibilidade mais filosófica, mais racional, mais consciente (digo assim por falta de termos melhores nesta manhã) comparado a quem desenha, por exemplo. Não digo consciente da ou na pieguice esquerdista, senão simplesmente esse pensamento capaz de se pensar. A imaginação visual pode ser abstrata ("não-figurativa", dizem os especialistas), a linguística jamais. Isso não é defeito ou motivo de choro, é só como as coisas são. Como as coisas se dão. A escrita moderna – chama(va)m escritura, poesia – tem disso de (se [meter a]) pensar. Oponhamos, pois oposições são muito modernas, a escrita a o escrito. É uma ideia interessante, só para evitarmos os termos de sempre – renovar as palavras é impedir à força a necrose (impedir a necrose à força?). A escrita é maleável, já apareceu em verso e prosa.
P.S. não é a alusão, nem a referência, tampouco a dificuldade, nem mesmo a forma(ta)ção, também não a invenção, ou a falta de sentido (ou seu excesso). É ainda outra coisa e claramente não a sei delinear, menos ainda definir.
P.P.S. talvez seja "encontrar uma língua"; mesmo isso parece insatisfatório, mas é preciso começar de algum lugar.
P.P.P.S. tem mais a ver com alquimia e ocultismo, hermetismo e esoterismo. Não é magia, estejamos atentos.

172. Odeio burocracia. Sinto-me nu (à força).

173. Um amigo começou a se perder como eu para os encantos da filosofia, está deixando sua poesia de lado (ele não era muito da prosa). Tenho medo disso. Quero dizer, parece-me um problema sério, um espírito do tempo, uma moda de época: "filosofia é legal porque o trabalho da ficção surge na criação de conceitos", tudo bem, mas ninguém está tão livre quanto estava na ficção, estão (estamos?) todos preocupados com (um)a realidade, com (um)a sociedade, etc., esse tipo de baboseira. Perdemos a última liberdade. Estamos nos alienando de nós mesmos. O que restará?

174. "À força" apareceu duas vezes, nas duas primeiras entradas de hoje, e agora é só oito da manhã. Não sei o que nos permeia, mas é aterrador.

175. Escreve-se por amor à literatura. Nada mais (nem menos).

176. Se é preciso come to terms com a mímese, façamos esse terrível trabalho: a arte não representa belamente, não deve criar imagens belas. (Quase) Ao contrário, deve imaginar justamente.

177. Literatura é devoção (total) à língua. "Qual língua?", perguntará o incrédulo. Não sabemos (ainda).

178. "Perto é outra coisa. Tuas fotos não te desenham nem um pouco.", disseram a ela.

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