sexta-feira, 19 de maio de 2017

Diário - 2017/05/18

46. Todo bom pensamento é um pensamento da vida e, pelo revés necessário, pela refração inevitável, é vida do pensamento. Essa história de morte é muito poética, mas já deu pra bola. Os filósofos precisam aprender com Oswald.

47. Não se produziu ainda nada à altura do concretismo nas letras brasileiras. E isso é dizer muito! Os caras não foram pouca coisa, ao contrário, foram muitíssimas e excelentíssimas coisas! A questão é que ninguém os herdou ainda. Talvez José Lino Grunëwald, mas mesmo assim O grau zero do escreviver é um saco, já atestado desde o título tributário à teoria sua contemporânea (mau sinal). O plano-piloto para poesia concreta era genial, exceto pela ilusão de ser algo frio, racional, desinteressado – eles foram outros que leram só um pedaço de Oswald: quando for estomacal será de verdade (gut feeling)! Afinal de contas, o cálculo é uma questão de paixão. De resto é um manifesto genial, não à maneira de outros posteriores, mais políticos, exatamente por não se envolver nessa sujeira e permanecer um manifesto teórico.

48. Uma única palavra: / uma única pá lavra / os sulcos da língua / ou da linguagem / é a poesia.

49. A pedra do caminho de Drummond mais ferrou do que ajudou a poesia. Ela se tornou poesia de "sacada", de "tirada" (humorística), poesia de wit. Leopardi repudiaria, com sabedoria, esse tipo de coisa. Não porque seja absolutamente irrelevante, não é, mas porque essa pretensa inovação tão marcante inexiste. O problema é, de fato, os leitores desse poemeto, os lambedores de botas, os que insistem na sua "atemporalidade", na sua importância infinita e sempre renovada (não pelo poema, mas pelas leituras dele). Qual o problema aqui? Falta espírito na língua.

50. Letra na imagem X letra e imagem.

51. 612309 (poesia)

52. Nunca diga que uma mulher é a coisa mais linda que você já viu na vida. Não porque ela não seja mesmo a mulher mais linda, mas porque isso é assumir que humanos importam muito quando não importam de fato. Há sempre coisas mais bonitas que nossos olhos a enxergar por aí.

53. As criaturas mais bonitas são as que estão eternamente morrendo.

54. É inviável ler qualquer texto sem hermenêutica, sem essa atitude de suspeita, sem filologia, sem o gesto da escavação. Nossa sociedade, como já venho dizendo, é pornográfica, quer dizer, crê e deseja o "nu e cru", a anti-hermenêutica. Por isso a pobreza de leitura. Toda língua é esse campo arqueológico, esse empilhamento de placas tectônicas – palavras sob(re) palavras.

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